23 julho 2010

Lingua de Trapo - 1981




Este é o segundo post, dessa banda que na minha opinião é simplesmente ótima, com suas letras repletas de humor ácido e inteligente, obrigando os ouvintes a pensar como no caso de "Xote Bandeiroso" que claramente fala sobre um certo cidadão que anos mais tarde viria a se tornar nosso Presidente da República, e "Tragédia Afrodisíaca" que depois de muita volta, relata a história por trás de um grande hit do nosso cancioneiro na voz de Cauby Peixoto (isso claro na versão deles da história), sem contar " Xingu Disco" que fala sobre a situação do Indio em nosso país, e contém seu maior sucesso "Concheta". Imperdível.

Segue Abaixo, entrevista exclusiva com Lizoel Costa, músico e fundador desse ótimo grupo.
(Obs: Entrevista concedida para meu MailZine denominado "Boletim Liga da Justiça 80" sobre a década citada, e divulgação da minha banda de mesmo nome, em 2007).



Onde surgiu a idéia do Lingua de Trapo?
Lizoel Costa: O Língua surgiu da cabeça de Laert Sarrumor, Carlos Castelo, Guca Domenico,  eu e Pituco. Nos conhecemos na Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero em meados de 79. A idéia Língua de Trapo começou a ser formada a partir daí, quando Eu e o Carlos Castelo, calouros da turma anterior onde estavam o Laert, o Guca e o Pituco, começamos a ver que tínhamos afinidades musicais e com o viés humorístico que viria a caracterizar o grupo. Antes de se chamar Língua de Trapo, era conhecido como "Laert Sarrumor e seus Cumplices". Tivemos a idéia de colocar um concurso interno na Faculdade pra criar o grupo e ganhou o nome "Lingua de Trapo" sugerido pelo Castelo.

Como foi gravar o primeiro disco da banda? Porque o disco é verde?
Lizoel Costa:  O primeiro disco, independente, foi um parto que definiu os rumos da banda. Com o grupo já conhecido nos circuitos de shows, começamos a juntar uma grana para investir no projeto, procuramos o estúdio Audio-Patrulha do Tico Terpins do Joelho de Porco e começamos as gravações. Foi suado, mas enfim, em 81 lançamos o LP em shows pela cidade, até que as edições posteriores do disco, acabou sendo bancada pela gravadora do Lira Paulistana. O disco era verde até como uma proposta de lembrar os discos infantis de historinhas. Na verdade isso era até uma forma de dizermos que o Língua era uma grande brincadeira.

Na época, como vocês faziam pra conseguir aparelhagem de som e instrumentos? Quais eram as Marcas disponíveis? Quanto custava por exemplo uma guitarra nova?
Lizoel Costa: Esse foi outro problema grande que tínhamos. Cada um teve que se arranjar como podia. Eu tinha uma guitarra Gianinni modelo Les Paul e um amplificador Bag da Gianinni também. A gente se virava emprestando equipamento daqui e dali e íamos levando. Na época, as marcas disponíves eram a Gianinni e a Snake, se não me engano e não eram baratas. Guitarra importada nem em sonho, só se você fosse muito rico. A minha Gianinni eu comprei, vamos colocar em dinheiro atual, por mais ou menos uns dois mil reais e ainda a prazo com a ajuda do meu pai. Não era fácil não. Uns três anos antes do grupo encerrar suas atividades, usei uma guibson Melody Maker emprestada de uma grande amiga nossa, a Angela Cristina e depois consegui comprar uma Ibanez e usava ainda como endorser, uma Dolphin GA 1000. Fui um dos primeiros endorsers de guitarra do país.

Mudando um pouco de assunto: Hoje em dia como você vê a década de 80, culturalmente falando?
Lizoel Costa: Os anos oitenta foram uma década de transição e até injustiçada, pois foi nela que as transformações políticas (fim da ditadura militar, abertura econômica etc...) começaram a dar uma cara à realidade brasileira  saida dos anos de chumbo do regime de exceção. Culturamente foi significativa na medida em que a juventude começou sentir os ecos dos movimentos musicais da Europa principalmente e começou a criar coragem e montar sua banda e sair tocando. Para minha formação, os anos setenta foram mais importantes, no entanto os oitenta foram a grande vitrine de tudo que assimilei na década passada.

Como foi a relação da banda com a política na época?
Lizoel Costa: O Língua era um grupo eminentemente político na medida em que as músicas e letras falavam sobre assuntos ligados à situação do país. Se você pegar os 3 primeiros discos nossos, quase todas as músicas versavam sobre histórias com críticas ácidas à ditadura e a todos os autoritarismos da vida diária.

O Pessoal da banda tinha outras atividades além da música, ou era possível sobreviver de Shows e discos?
Lizoel Costa: O nucleo central do grupo era formado por jornalistas, mas, de 80 até 87 a gente fez o possível pra viver só do nosso trabalho musical com o Língua e acho que até certo ponto conseguimos nosso intento. Com as dificuldades econômicas assolando a realidade brasileira, com a gravadora sacaneando com a gente em relação ao terceiro disco, o plano cruzado pra fuder com tudo e a gente com esposas e filhos pra sustentar, resolvemos encerrar as atividades do Língua, que depois voltou em 91 só com dois integrantes originais: O Laert e o Sergio Gama

O que o Lizoel Costa, buscava atingir com o Lingua?
Lizoel Costa: Não só com o Língua, mas com a música. Sempre investi minha vida na música e o Língua foi uma passagem importante dessa história. Na época que entrei na faculdade de Jornalismo e conheci outros integrantes da banda, eu era músico profissional, tocava na noite e já tinha uma história com isso. O Língua foi um vislumbre importante na minha carreira e guardo com carinho minha vida nele.

Fora Lingua de Trapo, você chegou a participar de outros grupos musicais? Quais?
Lizoel Costa: Sim, depois do Língua, andei levando alguns projetos como a dupla com o cartunista Paulo Caruso, além disso toquei em outro grupo de cartunistas chamado "Muda Brasil Tancredo Jazz Band" onde também participavam além de mim na guitarra e o Paulo no Piano, o Reinaldo do Casseta e Planeta no baixo  Mariano, e Luis Fernando Veríssimo na Clarineta e Saxofone respectivamente, e o Cláudio Paiva também do Casseta na Bateria. Era um grupo que tinha a mesma linha do Língua. Depois deles, meu último trabalho em São Paulo como músico foi com a Banda Nacional, formada por mim na Guitarra, Gerson Conrad(Do Secos e Molhados) também na guitarra e voz, Reinaldo no Baixo, Renato Barbieri nos teclados e Paulinho na Bateria. Foi meu último projeto e chegamos a fazer alguns shows e, no final do ano de 88 voltei para minha terra natal, Campo Grande em MS onde vivo até hoje*. Por aqui ainda acompanhei com artistas da terra como Paulo Simões e Sandra Menezes e cheguei a gravar alguns trabalhos em CDs.

O que o Lizoel faz hoje como profissão? E como Hobby?
Lizoel Costa: Hoje trabalho como Jornalista. Até ano passado trabalhei na Rádio FM Educativa de Campo Grande, além de outros veículos de imprensa. Atualmente estou montando um site de cultura e tenho outros projetos. Deixei de tocar profissionalmente há mais de 6 anos.

Hoje você está bem longe de São Paulo, mas, voltaria pra pra fazer música?
Lizoel Costa: Realmente não sei se voltaria. Teria que ser um projeto muito bom e consistente economicamente para eu arriscar. Minha história musical ficou na saudade. Continuo tocando e compondo mas, já não faço disso minha referência de vida.



* Atualmente, Lizoel Costa mora em Brasília - DF.

O Colecionador de Discos

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